Momentos prazerosos, como saborear um sorvete ou tomar um café quente, tornam-se experiências desagradáveis para as pessoas que sofrem de sensibilidade dentária (ou dentinária). A sensação de dor aguda e repentina impacta diretamente a qualidade de vida de mais de 40 milhões de brasileiros, segundo um estudo realizado pela Kantar. Além de ser muito mais comum do que se imagina, esse problema também é subestimado pela grande maioria dos pacientes, o que atrasa o diagnóstico e o tratamento corretos.
A sensibilidade dentária tem origem multifatorial e ocorre quando a dentina, uma camada interna do dente, que é normalmente protegida pelo esmalte e pela gengiva, fica exposta. Essa exposição permite que estímulos, como frio, calor, doce, pressão ou até o toque da escova, atinjam os nervos do dente, causando dor ou desconforto.
De acordo com a professora de Odontologia da UniSociesc, Helena Polmann, embora a cárie tenha sido por muito tempo a principal vilã quando o assunto era saúde bucal, “hoje tem se observado um aumento das chamadas ‘lesões não cariosas’, que são causadas por fatores diversos, como escovação incorreta, apertamento dental (o bruxismo) e problemas de oclusão (quando os dentes não se encaixam corretamente). Essas situações podem causar o desgaste do esmalte, expondo a dentina, o que aumenta a sensibilidade”, explica
Alimentos e bebidas com alto grau de acidez também têm papel importante nesse processo. Sucos cítricos, refrigerantes, águas com gás e até alguns tipos de vinhos e isotônicos, apesar de parecerem inofensivos ou até saudáveis, podem comprometer a saúde dos dentes se consumidos em excesso.
Outro fator pouco conhecido, mas relevante, é o refluxo gastroesofágico. A professora explica que o ácido estomacal, ao alcançar a boca, ataca a estrutura dos dentes de forma silenciosa e contínua. “É como se, o tempo todo, um líquido ácido estivesse em contato com os dentes, desgastando-os lentamente”, elucida.
Impacto na qualidade de vida
A sensibilidade dentária pode parecer apenas um desconforto ocasional, mas afeta diretamente o bem-estar das pessoas. A especialista da UniSociesc observa que, muitas vezes, o incômodo é interpretado como algo normal, o que leva à negligência do problema. “O paciente ‘acostuma-se’ a sentir dor ao tomar um sorvete, por exemplo, e assim evita de procurar ajuda”, comenta Helena.
Como resultado, hábitos prazerosos, como apreciar uma bebida gelada no verão, acabam sendo deixados de lado. Com o tempo, além do prejuízo emocional, há também um agravamento do problema bucal. Se não tratado adequadamente, o desgaste do dente pode evoluir para situações mais graves, como exposição do canal (necessitando de tratamento de canal), fraturas, necrose da polpa, retração gengival acentuada, perda do dente e até dificuldades na mastigação e fala.
Prevenção começa na escova
Segundo a professora da UniSociesc, a prevenção da sensibilidade começa com escolhas simples no dia a dia, como a da escova de dentes. “Sempre recomendo as opções com cerdas macias ou extra macias. Muita gente acredita que escovas duras limpam melhor, mas isso é um mito”, explica.
A técnica de escovação também faz toda a diferença. Ao contrário do que se pensa, força não é sinônimo de limpeza. “O ideal é fazer movimentos suaves, controlados e conscientes, como se estivesse lavando um carro com uma esponja delicada”, compara Helena.
Além disso, ela destaca a importância de limitar o consumo de alimentos e bebidas ácidas. “Muitas pessoas optam por sucos naturais pensando na saúde, mas sucos de laranja e limão, por exemplo, têm pH muito ácido e, quando consumidos com frequência, podem ser agressivos para o esmalte dentário”, alerta.
O caminho do cuidado
Diante da variedade de causas e sintomas, a melhor forma de cuidar da sensibilidade dentária é estabelecer uma rotina preventiva e manter o acompanhamento com um profissional. A professora recomenda visitar o dentista pelo menos duas vezes ao ano, mesmo que não haja dor ou desconforto aparente.
“É durante a consulta de profilaxia, aquela limpeza rotineira, que conseguimos detectar sinais iniciais de sensibilidade e evitar que ela avance. Quanto mais cedo o diagnóstico, mais simples e barato é o tratamento”, reforça.
A professora ainda reforça três outras dicas simples e práticas para prevenir a sensibilidade dentária:
- Evite excesso de alimentos e bebidas muito ácidos: consumo frequente de sucos cítricos, refrigerantes, vinhos, isotônicos e até água com gás pode desgastar o esmalte dos dentes e causar sensibilidade.
- Use escovas de cerdas macias ou extra macias: escovas duras e força excessiva na escovação danificam a superfície dental. O ideal é escovar com movimentos suaves e técnica correta.
- Esteja atento ao bruxismo e problemas de mordida: apertamento dos dentes e má oclusão podem gerar sobrecarga e desgaste dental. Ao menor sinal, procure um dentista.
A mensagem final da especialista é clara: sentir dor ao consumir alimentos gelados ou ácidos não é normal e merece atenção. “É preciso desconstruir essa ideia de que ‘é só um incômodo pontual e faz parte’. Cuidar dos dentes é um ato de autocuidado que melhora a saúde como um todo”, garante.